segunda-feira, 26 de abril de 2010

DISCIPLINA MILITAR - José NOGUEIRA Sobrinho

Tenho a honra e o orgulho de publicar  neste espaço o trabalho do meu primeiro mentor de vida profissional como piloto, o ex-soldado, o ex-sargento e o Coronel da Reserva Remunerada José Nogueira Sobrinho.


Muito antes de existir o conceito de "coaching" e "mentoring" este, então, capitão, no meio do hangar das oficinas de aeronaves da Base Aérea do Recife chamava-me para conversar sobre vida e profissão. O primeiro livro corporativo foi ele quem me emprestou: "O gerente minuto."



DISCIPLINA MILITAR
                                                      José NOGUEIRA Sobrinho – Ten Cel Esp Av Ref FAB
 Oficial  de Segurança de Vôo, Oficial de Manutenção e Engenheiro de  Vôo da Força Aérea
                                                                                 gonnog@hotlink.com.br 
“O grau hierárquico não foi criado para separar os homens (militares), mas apenas para definir os vários graus de responsabilidade.” - Marechal-do-Ar Eduardo Gomes. 
      1 – PRÓLOGO
      Trecho de carta aos oficiais, do general Senger, comandante panzer alemão na II Grande Guerra: “Desde os tempos mais antigos, quando os trovadores cantavam baladas cavaleirescas na Provença, até o tempo em que a Prússia aperfeiçoou o ideal do ‘oficial profissional perfeito’, e nossos inimigos de hoje o do ‘oficial cavalheiro perfeito’, o único princípio orientador era que o senhor ou oficial feudais, o homem na posição de autoridade, deviam dedicar-se à proteção dos mais fracos. Seus subordinados estão colocados nessa situação pela autoridade que o Estado lhes confiou. São colocados nela sob sua proteção e dependem inteiramente de sua capacidade de julgamento, seus cuidados, suas decisões”. 

      2 - CONCEITO
      A instituição militar sustenta-se no binômio hierarquia e disciplina permeado pela lealdade militar, e é nesse contexto que se deve entender a mensagem do general Senger sobre julgar, cuidar e decidir. A hierarquia baseia-se na superioridade apenas hierárquica de um militar sobre o outro e se manifesta na disciplina, usada pela hierarquia no cumprimento da missão.

      A disciplina pressupõe, assim, um código de normas (doutrina) a ser seguido na transmissão e na execução de ordens.

      Didaticamente a disciplina pode ser vista sob quatro aspectos: o consciente, o intelectual, o complementar e o verdadeiro. 

      3 – DISCIPLINA CONSCIENTE
      A ética militar impõe a disciplina consciente, aquela que necessariamente faz sentido e é compreendida. Instrua-se o homem e a mulher no entendimento do que faz no cumprimento da missão, e não será preciso humilhar ninguém, coagido a obedecer cegamente.

      A disciplina consciente também não existe se não há, por parte do superior, a compreensão do seu papel como superior hierárquico. Cultua-se a hierarquia, e não a pessoa do superior, obrigado a se mostrar à altura do lugar que ocupa.

      A quebra dessa regra transforma a disciplina em instrumento de coação moral manipulado por chefes de “índole oporrinhativa (sic), que é de certa condição humana mais insuportável nas corporações militares, cujas vítimas não se podem defender senão por um achatamento: o da submissão ou da bajulação” (Almirante Macedo Soares). 

      4 – DISCIPLINA INTELECTUAL
      A disciplina intelectual é o refinamento da disciplina consciente. Significa tanto o direito como o dever de todos de contribuir para o aperfeiçoamento das idéias que levam à melhor solução dos problemas.

      Ela acontece em todos os escalões quando os chefes (geralmente os descentralizadores) colocam em debate as questões antes das tomadas de decisão.

      Significa, também, que se pode discordar de tudo e de todos e discorrer livremente sobre o que se pensa, durante as discussões. Mas, depois da decisão tomada, quem foi voto vencido se obriga intelectual e conscientemente a trabalhar pelo sucesso da idéia vencedora.

“ENSAIOS” – pág 9 (1 de 2) 
      5 – DISCIPLINA COMPLEMENTAR
      Apesar de acessória, é a mais visível. Pode levar o desavisado a não se dar conta de fundamentos mais importantes da disciplina. Estudos mostram que a apresentação pessoal, base da disciplina complementar, depende 7% da voz, 38% do que diz essa voz e os restantes 55%, praticamente da roupa que o indivíduo veste.

      A voz e o que diz essa voz são marcas importantes do líder. Os 55% da roupa, no caso, a farda, compreendem não só a farda impecável, mas todo o ritual em volta dela: atitude, gesto e duração da continência, ordem unida, paradas diárias, cabelo cortado, barba feita, unhas limpas e aparadas, banho tomado, andar e postura marcial, atitude militar. 

      6 – A VERDADEIRA DISCIPLINA
      Conceitualmente, só existe a disciplina consciente. A disciplina quando humilha, achaca, deprime não é disciplina. Nos seus vários aspectos e manifestações (alguns aqui discutidos), visa o nobre fim a que se destina: a transmissão e a execução de ordens, característica (condição necessária e suficiente) da verdadeira disciplina.

      É dela que vem a ênfase na importância da cadeia de comando e nas subordinações conseqüentes. Implica forças numeradas e enquadra as unidades e os seus integrantes em um fluxo único de recebimento, transmissão e execução de ordens.

      Ressalte-se a importância de capitães, tenentes e sargentos como atores principais da verdadeira disciplina. São eles, com os soldados, os que morrem nas guerras, os que, de fato, travam as batalhas. São eles os que, nessa condição, fazem a ponte entre o comando e a tropa, o que torna obrigatório para eles conhecer de perto cada liderado. Do contrário, será impossível transmitir sem ruídos as ordens do comando e muito menos fazê-las cumprir sem desvios, como devido. 

      7 – CONCLUSÃO
      O exercício da disciplina é o exercício do conhecimento. Conhecimento da missão, do organograma, da cadeia de comando, dos fundamentos da guerra, do papel de cada um na guerra, da lealdade  militar, da ética militar. Trata-se do básico.

      A disciplina norteia o coração e a mente do militar. De tão importante, é absurdo alguém na tropa – comandante, oficial, soldado – agir apenas por instinto, e não conscientemente, por não dominar os verdadeiros valores da disciplina. Nessa condição, é grande o risco da disciplina se transformar em subserviência com os superiores e em arrogância com os subordinados.

     Fica claro, também, o significado psicológico da disciplina. A psicologia ensina que a pessoa pode ser, de acordo com o momento, afirmativa, arrogante ou submissa, quando deveria ser apenas afirmativa. E que é exatamente afirmação o que a disciplina exige das pessoas.

     Os tempos são outros. Motiva-se pelo convencimento. E o convencimento, hoje, só é possível pelo conhecimento. A retórica corporativista, com a sua “linguagem sedutora” carregada de clichês motivacionais, já não mais convence. Um país livre exige homens e mulheres livres para defendê-lo, e o maior exemplo disso é Israel, um vencedor.

     Com ética e verdade, FORÇA AÉREA, BRASIL! 
Recife – 2008 – Reproduza e divulgue.
“ENSAIOS” – pág. 10 (2 de 2).
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Um comentário:

  1. Ten Cel Nogueira, muito oportuno o seu texto neste momento em que confundem: Disciplina com Ética e Hierarquia com Humilhação, com se a camaradagem, a cortesia , o respeito, a bondade e a amizade são incompativeis com a vida militar.
    Preservar a Disciplina e a Hieraquia significa resguardar a reputacão, a unidade de ação, o emprego, a honra e a decência militar.
    Grato, Holanda -Cel PMDF/RR.

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