Este texto é um bom recorrido histórico a título de anúncio de fatos importantes. Contudo, a questão ideológica maculou a análise do articulista.
Estive no Chile em estudos e seminários e os membros da Academia de Altos Estudos reconhecem o boom econômico na caricata ditadura Pinochet, como quer fazer acreditar o autor.
Quanto à reserva de mercado, nosso parque industrial não sobreviveria às importações de empresas como a IBM ou o Carrefour se não houvesse a proteção.Tampouco teríamos a EMBRAER, as empresas do Vale do Paraíba, do pólo de Franca, da Zona Franca de Manaus, não teríamos o desenvolvimento em pesquisas agrícolas que viabilizou a EMBRAPA que hoje torna nossa agricultura um agrobusiness, não teríamos Sinop no Mato Grosso, talvez Campo Grande fosse ainda a segunda maior cidade do Mato Grosso e não uma capital. Talvez não tivéssemos Dourado ou o polo no interior do Paraná, de Petrolina, ou o Vale do Itajaí. Falar para uma platéia que não tem o hábito de estudar História é fácil.
Todavia há um mérito na análise do articulista que torna suas conclusões válidas. É um bom marco de análise histórica. Vale a pena ler e refletir.
Fábio Giambiagi - O Estado de S.Paulo
Há algumas semanas se cumpriram 25 anos do restabelecimento da democracia no Brasil por democracia se entende a existência de um governo civil, representativo da maioria da população.
Embora as primeiras eleições diretas depois de 1964 só viessem a ocorrer em 1989, é evidente que a chapa Tancredo Neves/José Sarney, eleita para assumir em março de 1985, representava, naquele momento, os anseios da maioria da população, embora as circunstâncias do destino tivessem definido na hora final o nome de Sarney como sendo o de quem iria comandar o País nos anos seguintes.
Os anos 80 foram marcados por processos de redemocratização em vários países da América Latina, entre os quais os casos mais importantes foram os do Brasil e da Argentina (pela importância de ambos os países) e, mais tarde, do Chile (por tudo o que representava de imagem quase caricaturesca de uma ditadura, o governo do general Augusto Pinochet).
Decorrido um quarto de século daquele momento histórico do País, em 1985, o que podemos dizer?
Em relação ao Brasil daquela época, o País de hoje se diferencia de forma marcante em três aspectos.
Em primeiro lugar, a democracia vai se consolidando cada vez mais. Depois de termos ultrapassado a difícil transição para o governo civil, passamos bem pelo teste do processo de "impeachment" contra Fernando Collor, pela experiência de um ciclo político completo de oito anos com Fernando Henrique Cardoso sem qualquer perturbação militar, pela alternância de poder de 2003 e por um governo de um partido com origem na esquerda; em todos os casos, com pleno respeito aos cânones e padrões de qualquer democracia.
Nesse sentido, o Brasil é um país maduro.
Em segundo lugar, a estabilidade é uma diferença enorme em relação ao Brasil de um passado distante, da época dos 2.000% ou 3.000% de inflação anual.
A vida cotidiana, a agenda política, a autoestima da nação, etc., são completamente diferentes em um país com uma inflação em torno de 5% ao ano do que em outro onde essa era a taxa de inflação de dez dias.
Finalmente, a modernização da economia nesses 25 anos é patente, para quem acompanha a vida do Brasil desde aquela época.
O País passou de uma economia onde as empresas sobreviviam ao custo de uma reserva de mercado e de níveis de proteção completamente anacrônicos a um "global player", com várias empresas globais em condições de disputar de igual para igual os mercados mundiais com as melhores empresas do planeta, níveis de atração de investimento estrangeiro inimagináveis há apenas 15 anos e que se prepara para uma grande onda de investimentos, associados à exploração dos recursos do pré-sal e aos grandes eventos esportivos de 2014 (Copa do Mundo) e de 2016 (Jogos Olímpicos).
Embora sem ter o mesmo destaque, porque nesse caso a diferença não é tão marcante, cabe citar uma quarta mudança, relacionada com a redução do contingente de indivíduos que vivem na extrema pobreza e a diminuição, ainda que incipiente, dos indicadores de desigualdade, como o Índice de Gini.
O que falta, então, à guisa de balanço, para o Brasil completar a sua trajetória de desenvolvimento? Em linhas gerais, pode-se dizer que a agenda ideal envolve quatro pontos:
1)O ataque à extrema pobreza como uma mazela inaceitável. Não é admissível que um país como o que o Brasil aspira a ser daqui a dez anos comporte ainda contingentes populacionais expressivos de pessoas que ganham níveis miseráveis de rendimento. Houve avanços importantes nesse campo nos últimos 15 anos, mas é preciso progredir mais ainda de agora em diante;
2)A melhora das condições de segurança nas grandes cidades. Embora tenha havido progressos em São Paulo e comece a haver, mais recentemente, avanços no Rio de Janeiro, estamos muito distantes dos níveis de segurança que se pode ter caminhando nas grandes cidades dos países desenvolvidos. A necessidade de assumir essa agenda é óbvia e a sua relação com o bem-estar dos indivíduos, também;
3)A modernização da classe e das atitudes da classe política. Enquanto a economia brasileira "saiu bem na foto" na crise de 2009 e as empresas brasileiras se revelam pujantes, a sucessão de escândalos nas páginas de política nacional envergonha qualquer cidadão com um mínimo de decência;
4)O investimento, em legislação e em recursos, para que a justiça funcione melhor. A sensação de que, usando a taxonomia de Elio Gaspari, há, para vários campos da vida nacional, um "andar de cima" para quem, entre outras coisas, as leis não se aplicam é uma chaga da vida nacional.
A tarefa de conseguir que indivíduos com recursos que infrinjam a lei sejam efetivamente julgados, condenados e presos, sem se valer das infindáveis possibilidades de recurso, é, provavelmente, uma das maiores tarefas pendentes da democracia brasileira.
Se essas questões forem encaradas e resolvidas com êxito nos próximos dez anos, o Brasil de 2020 será muito melhor do que o de 2010, assim como o de 2010 é claramente superior ao de 1985.
É ECONOMISTA. AUTOR DO LIVRO "REFORMA DA PREVIDÊNCIA" (ED. CAMPUS)
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