Valor Econômico
Foram divulgados na semana passada os resultados do Pisa 2009, o Programme for International Student Assessment, da responsabilidade da OCDE, com o desempenho dos alunos de vários países nos exames de proficiência em leitura, matemática e ciências. Esses resultados são muito aguardados pelos países participantes pois revelam como está o aprendizado dos alunos com 15 anos de idade, fazem um ranking de países e mostram sua evolução ao longo do tempo. O que mostram esses resultados?
A grande surpresa deste ano foi o desempenho dos estudantes da província chinesa de Xangai, que participaram pela primeira vez do exame e obtiveram um desempenho espetacular. Os estudantes chineses ficaram em primeiro lugar em leitura, matemática e ciências, superando todos os países da OCDE e os demais países participantes. Em matemática, os chineses obtiveram 600 pontos, quase 38 pontos acima do segundo colocado (Cingapura), 113 pontos acima do Estados Unidos e 214 pontos acima da média dos alunos brasileiros. Se compararmos os alunos de Xangai com os do Distrito Federal (a unidade brasileira com melhor desempenho), a diferença é de 175 pontos. Alguém ainda tem dúvidas de que os chineses irão dominar o mundo?
O desempenho dos alunos brasileiros continua muito ruim, mas vem crescendo ao longo dos anos. Entre os 65 países que participaram do exame, o Brasil ficou em 57º lugar em matemática. Para termos uma ideia de quão crítica é a nossa situação, 70% dos alunos brasileiros estão no nível mais baixo de desempenho em matemática, em comparação com apenas 4,8% dos alunos de Xangai e 8,1% dos coreanos. Em relação aos nossos vizinhos sul-americanos, os alunos brasileiros obtiveram um desempenho em leitura parecido com os colombianos, acima dos argentinos e peruanos, mas abaixo dos chilenos e uruguaios. E pensar que os argentinos estavam entre os povos mais educados da América Latina no início do século passado.
Enquanto os chineses tratavam de fazer sua educação competitiva, os brasileiros discutiam a taxa de câmbio
Entre 2000 e 2009 o desempenho dos alunos brasileiros aumentou 16 pontos em leitura, 52 pontos em matemática e 30 pontos em ciências. Assim, o maior avanço foi em matemática, disciplina em que os alunos brasileiros tinham o pior desempenho. Mas, é preciso aumentar o ritmo desse avanço, caso contrário levaremos 40 anos para alcançar o desempenho atual dos chineses. Outro ponto importante é que o nosso aumento da proficiência em leitura ocorreu às custas de uma maior desigualdade. Enquanto o desempenho dos nossos melhores alunos aumentou cerca de 30 pontos, entre os piores praticamente não houve melhora.
Assim, a desigualdade na qualidade da educação está aumentando. Vale notar também que grande parte do avanço obtido em leitura ocorreu entre as meninas, sendo que o crescimento da nota entre os meninos foi insignificante.
Vale a pena contrapor a nossa evolução educacional com a ocorrida no Chile. Em leitura, por exemplo, o desempenho dos alunos chilenos aumentou 40 pontos, mais do que o dobro dos brasileiros. Entretanto, no caso do Chile o desempenho aumentou mais entre os piores alunos do que entre os melhores. Assim, a qualidade da educação no Chile melhorou com queda na desigualdade, o melhor dos mundos. Por fim, a melhora ocorreu tanto entre os meninos como entre as meninas. Mas, que políticas educacionais tiveram efeito tão positivo no Chile?
Segundo o relatório do próprio Pisa, as principais políticas parecem ter sido o foco nas escolas com pior desempenho, o aumento do número de horas-aula, mudanças no currículo nacional, aumento dos gastos com educação e avaliação completa do desempenho dos professores das escolas públicas, incluindo observação do seu desempenho em classe. Os professores que forem reprovados três vezes nessa avaliação são demitidos. Além disso, as escolas e os professores com melhor desempenho recebem mais recursos e maiores salários. Aumento de gastos com mais horas-aula, acompanhado de medidas que introduzam a meritocracia na vida escolar parece ser a receita para o sucesso.
Em suma, o desempenho dos alunos brasileiros vem melhorando na última década, graças a uma série de políticas educacionais corretas que foram sendo introduzidas por diferentes ministros, no sentido de descentralizar a gestão, criar sistemas de avaliação, divulgar os resultados das avaliações por escola e estabelecer metas para cada uma delas. Além disso, inovações nas redes estaduais e municipais de educação, principalmente aquelas com ênfase na meritocracia, tiveram um papel importante.
Entretanto, esse avanço tem ocorrido de forma lenta e puxado pelo desempenho dos melhores alunos e das meninas. Assim, enquanto a desigualdade no acesso à educação está declinando e puxando para baixo a desigualdade de renda, a desigualdade na qualidade da educação caminha no sentido contrário, o que retardará a queda na desigualdade de oportunidades.
Por fim, os resultados do Pisa mostram claramente que os chineses estão fazendo a sua lição de casa, obtendo avanços significativos nas questões mais fundamentais da sua sociedade, para torná-la mais competitiva. Enquanto isso, os brasileiros passaram o ano inteiro discutindo a taxa de câmbio!
Naercio Menezes Filho é professor Titular - Cátedra IFB e coordenador do Centro de Políticas Públicas do Insper e professor associado da FEA-USP.
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