terça-feira, 14 de dezembro de 2010

Maquiagem educacional

ZERO HORA (RS)


A pretensão do Conselho Nacional de Educação (CNE) ao recomendar que as escolas evitem reprovar alunos até o terceiro ano do Ensino Fundamental pode ser bem-intencionada, mas uma mudança desta importância não deve ser implantada sem um engajamento firme da sociedade no debate sobre suas implicações. A proposta ainda será avaliada pelos conselhos estaduais, que terão autonomia para aplicá-la ou não. Ainda assim, é importante que haja absoluta clareza sobre se o objetivo, de fato, é preservar os interesses das crianças ou melhorar artificialmente os indicadores educacionais. O que importa, no caso, é a qualidade do ensino ministrado e como os alunos podem fazer bom uso do conteúdo aprendido para aproveitar melhor as próximas séries e chegar ao final do Ensino Básico, de preferência habilitando-se para cursar uma universidade.

Um aspecto fundamental, como destaca a educadora Esther Grossi, é não partir de conclusões equivocadas como a de que uma criança não tem condições de aprender. É importante levar em conta que o aprendizado não depende apenas do esforço pessoal do aluno, mas também dos professores, da própria escola e dos pais. Toda criança deve ser estimulada na sua capacidade de aprendizagem, mas também precisa aprender a conviver desde cedo com a realidade de um cotidiano marcado por constantes avaliações. Gratificações e frustrações relacionadas ao seu desempenho escolar são inerentes ao seu processo de aprendizado tanto na escola quanto na vida. Os próprios educadores são constantemente testados na sua capacidade de transmitir conhecimentos. Não por acaso, cada vez se procura aprimorar mais a forma de remunerá-los por critérios meritocráticos.

A proposta definida agora guarda semelhança com a experiência dos ciclos, com origem nos termos da Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB), de 1996, que concedeu autonomia a Estados, municípios e escolas para adotar, ou não, esse sistema. A LDB determina que, nos ciclos, a avaliação deve ser feita no dia a dia da aprendizagem, de diversas formas, incorporando-se à educação formal a experiência de vida trazida pelo aluno do seu universo familiar e social. No Brasil, a introdução do sistema de ciclos no Ensino Fundamental surgiu sob polêmica: de um lado, é vista como tentativa de ocultar chagas como a da repetência no país, e, de outro, como um avanço para garantir a permanência e o aprendizado dos estudantes na escola. É esta questão que precisa ser bem administrada para evitar ainda mais problemas à frente.

As séries iniciais têm impacto direto na alfabetização, que é um desafio permanente do país, e em consequência no aprendizado das demais disciplinas, pois não há como avançar sem dominar a leitura. O país tem o dever de garantir eficiência a essa fase decisiva para o futuro de nossas crianças.
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