terça-feira, 21 de dezembro de 2010

REEQUILIBRAR A POLÍTICA EXTERNA

O GLOBO


O ministro das Relações Exteriores do governo Dilma Rousseff, Antonio Patriota, ocupou os mais altos postos do Itamaraty durante a longa gestão Celso Amorim e era, desde 2009, seu secretário-geral. Não romperá, nem poderia, com as linhas gerais da política externa brasileira nos últimos oito anos. Mas poderá, espera-se, com um cauteloso balanceamento das ênfases, reequilibrá-la. 

Antes da confirmação formal para a Chancelaria, Patriota afirmou que a diplomacia brasileira continuará se pautando pela diversificação de parceiros, especialmente no eixo Sul-Sul. E ressaltou que o fechamento de acordos tarifários não ficará restrito a foros tradicionais, como as rodadas da OMC, mas que o país permanecerá engajado "na via multilateral". Nas entrelinhas, com boa vontade, pode-se ler que a guinada em favor do terceiro-mundismo militante, uma das opções equivocadas da política externa de Lula/Amorim, ao privilegiar o superado conceito do Sul pobre contra o Norte rico, poderá ser amenizada na busca "pela diversificação de parceiros". E que fechar vantajosos acordos bilaterais de comércio, algo que ficou em segundo plano na gestão Lula/Amorim, ganhará nova ênfase. E é preciso mesmo, pois a preferência pelo terceiro-mundismo não conseguiu fazer o Brasil aumentar sua fatia no comércio internacional, como demonstram as estatísticas disponíveis. O bom trânsito de Patriota em Washington, onde foi embaixador de fevereiro de 2007 a outubro de 2009, abre novas perspectivas nas relações com o país (ainda) líder do mundo, travadas pelo antiamericanismo da política externa brasileira nos últimos oito anos. Mais um subproduto da diplomacia companheira. 

Em entrevista ao GLOBO, o embaixador José Botafogo Gonçalves, presidente do Centro Brasileiro de Relações Internacionais (Cebri), diagnosticou, de forma correta, que, na Era Lula, a política externa foi desviada da rota, prevalecendo os interesses do governo e do partido majoritário, o PT, sobre os do Estado brasileiro. Para Botafogo, sobrou ideologia e faltou eficácia e pragmatismo, o que o futuro chanceler terá - espera-se - oportunidade de corrigir, apesar da permanência de Marco Aurélio Garcia no governo. Um dos exemplos dos descaminhos é a política em relação ao Irã, país que busca a todo custo desenvolver a tecnologia nuclear. O Itamaraty se empenhou em evitar que o presidente Mahmoud Ahmadinejad, personagem indigno de confiança, fosse levado às cordas pela pressão internacional, à frente os Estados Unidos. Brasília, junto com a Turquia, tentou um acordo de última hora para evitar novas sanções da ONU a Teerã e acabou enganado: o acordo subscrito pelos iranianos ficava muito longe do que exigia a comunidade internacional. Pior: o Brasil ficou isolado. Mais adiante, Lula e Amorim instruíram a representante brasileira na ONU a se abster numa votação que condenava o Irã por práticas medievais, como o apedrejamento até a morte de mulheres supostamente adúlteras. 

Pelo menos nesse ponto, o futuro chanceler deverá encontrar o caminho limpo pela presidente eleita. Em entrevista ao "Washington Post", Dilma foi curta e clara a respeito: "Não concordo com o voto brasileiro. Não é minha posição." Pode ser um bom sinal. 
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